Relação entre o museu e seu entorno deve voltar ao cerne das discussões com a crise sanitária
Por Michael Lopes Argento
É inegável o avanço que os museus têm empenhado nos últimos anos para aproximar o patrimônio cultural de seu público por meio de uma mediação dialógica. Mesmo em detrimento de orçamentos e equipes enxutas, muitas instituições museológicas já desenvolvem programações culturais, ações educativas, projetos e programas visando ampliar a atuação e participação da comunidade. Da mesma forma, o desenvolvimento de políticas públicas vem seguindo essa tendência, incentivando o aperfeiçoamento de instâncias participativas, ações extramuros e colegiados que envolvam cada vez mais a comunidade nas questões decisórias sobre os caminhos pelos quais os museus devem percorrer para atingir suas funções sociais.
É neste contexto que a Secretaria de Cultura e Economia Criativa de São Paulo, por meio da Organização Social ACAM Portinari, lançou em 2011 a publicação Para além dos muros: por uma comunicação dialógica entre museus e entorno, resultado das pesquisas de Cristiane Batista Santana sobre o papel contemporâneo da comunicação e sua relação com os museus.
A autora inicia a publicação, dividida em sete capítulos, fazendo uso de amplo arcabouço teórico para relacionar conceitos como cultura, comunicação e linguagem para evidenciar as instituições museológicas no debate sobre a preservação e extroversão do patrimônio cultural, situando-as em complexas relações sociais sobre as quais não podem permanecer isentas. Como estudo de caso, escolheu o Museu da Energia de São Paulo, equipamento cultural localizado entre o Bom Retiro e os Campos Elíseos, bairros situados na região central da capital paulista e que passaram por intensas transformações sociais nas últimas décadas.
Entrevistando grupos e entidades sociais atuantes na região do museu, bem como profissionais de instituições culturais também localizadas nas proximidades, a autora buscou reunir dados qualitativos, expectativas e experiências de forma a estabelecer propostas de promoção de uma comunicação dialógica entre o museu e as comunidades do entorno, considerando suas especificidades e seus limites institucionais. O resultado deste amplo trabalho de coleta de informações resulta em um conjunto de sugestões de ações dialógicas junto às comunidades e entidades do entorno, centrando na figura do Gestor de Comunicação, profissional marcado por sua natureza interdisciplinar, um papel de relevância ao fazer uso das linguagens e promover o diálogo e a apropriação do patrimônio cultural por parte de comunidades plurais.
As políticas de isolamento social causadas pela crise sanitária da covid-19 reavivam a discussão sobre o papel e o compromisso de museus e outros equipamentos culturais junto às comunidades do entorno, sobretudo aquelas que não dispõem de recursos tecnológicos para começar ou continuar acompanhando a execução de projetos e a realização de programações culturais destas instituições em âmbito virtual. Os museus e equipamentos culturais deveriam ser inseridos sistematicamente nas grades de programação de meios de comunicação de massa, como a televisão e o rádio? De que forma os museus poderão contribuir após a crise sanitária para a recuperação, além de cultural, mas também econômica e social? Como delimitaremos as comunidades do entorno se o ambiente virtual não possui fronteiras geograficamente definidas? O que parece certo é que a crise gerará soluções criativas e solidárias, e também caberá aos museus assumir – e proporcionar às comunidades – o protagonismo.
Leia mais sobre a obra:
Guarde esta resenha para ler depois:
SANTANA, Cristiane Batista. Para além dos muros: por uma comunicação dialógica entre o museu e entorno. Brodowski (SP): ACAM Portinari; Secretaria de Estado da Cultura de São Paulo, 2011.