A gestão é o grande desafio dos profissionais de museus do século XXI.
Otávio Balaguer – ACAM Portinari
Administrar um museu não é tarefa fácil. Toda a gestão de um equipamento cultural é desafiadora – não importa a sua dimensão – sobretudo dos que salvaguardam coleções significativas para suas comunidades. De um lado está o seu público, que coloca demandas de salvaguarda, comunicação, e fruição e as cobra dos gestores. De outro está o fluxo de trabalho, volume de recursos, cenário ideal e cenário real.
Se fosse perguntado, diretamente aos profissionais de museus, quais são os desafios em administrá-los, certamente haveria inúmeras respostas que dizem respeito a um dos vários campos da gestão: financiamento, recursos humanos, comunicação, conservação, documentação, etc.
Foi pensando na necessidade de apoio às instituições museológicas paulistas que o Sistema Estadual de Museus de São Paulo (SISEM-SP), instância da Secretaria de Cultura e Economia Criativa de São Paulo, em parceria com o Conselho Internacional de Museus (ICOM Brasil ) e a Associação Cultural de Apoio ao Museu Casa de Portinari (ACAM Portinari), traduziu e publicou a obra “Como gerir um museu” – versão em língua portuguesa de “Runing a museum”.
Editado e organizado por Patrick J. Boylan, o livro é fruto de colaboração do ICOM com a UNESCO. A publicação original surge da necessidade de requalificação dos museus no Iraque, país que vivenciou fortes conflitos militares nas últimas décadas, os quais afetaram diretamente as instituições de memória. Contudo, o valor universal do título foi reconhecido pela comunidade museológica internacional que pleiteou sua publicação em outros contextos, para além do mundo árabe.
Dividido em dois volumes, “Manual Prático” e Manual do Instrutor”, o conjunto da obra permite qualificar profissionais para satisfazer as ações concernentes ao funcionamento do museu em consonância com as exigências do século XXI. Os textos apoiam um processo educativo individual ou coletivo, para isso o “Manual do Instrutor” proporciona orientações para a condução de verdadeiras “turmas”. Independente do caminho escolhido, o aprendizado será garantido.
O objetivo dos 12 capítulos do “Manual Prático” é oferecer recomendações técnicas e itens de discussão para os profissionais de museus. Os autores são consagrados profissionais de visibilidade internacional, que desenvolvem, por meio de tópicos, temas que abordam os processos museológicos. Dentre os quais se destacam: ética profissional; gestão de acervo, recursos humanos e museu; documentação e informação; preservação de acervo; exposições; educação museal; segurança.
A importância desta tradução é apontada pelo próprio organizador na introdução ao reconhecer que a atividade administrativa dos museus é historicamente executada por entes externos a ele, como governos regionais e municipais. Contudo, o autor sinaliza uma crescente descentralização nessa gestão e o aumento da necessidade de capacitação dos quadros internos.
Já que a obra possui um caráter prático, intrínseco ao tema, talvez caiba aqui um pequeno exercício para animar o leitor a desbravar o manual. Vejamos uma das provocações sugeridas em atividade:
Ética – Estudo de Caso 2 Você está tentando formar um acervo representativo em sua área. Existem algumas lacunas que ainda devem ser preenchidas. Você possui também uma série de itens do mesmo tipo que foram doadas ao museu, embora as associações a pessoas, lugares e outros materiais sejam diferentes. Um colecionador local possui dois itens que ajudariam a completar seu acervo e oferece trocá-los por itens que você possui e que são do mesmo tipo. Como você procederia?
Primeiramente é necessário determinar o caso: a situação hipotética se trata de uma proposta de permuta. Ao que tudo indica, uma pessoa física oferece ao gestor a troca de peças entre coleções de uma mesma tipologia de objetos de modo que, pela maneira que se coloca o caso, ambas coleções ficariam satisfeitas e incrementadas.
Em um segundo momento, elencar os pontos de atenção: a oferta é feita ao responsável pela coleção, e não institucionalmente dirigida ao conselho do museu. Isso nos faz pensar sobre a impessoalidade na administração, sobretudo dos equipamentos públicos, nos quais o gestor não pode tomar decisões pautadas em suas relações e conclusões pessoais, mas precisa submetê-la às instâncias competentes previstas no Ato de Criação e/ou Estatuto do Museu.
E por fim, apresentar uma resposta: o caminho razoável para solucionar a contenda é olhar a Política de Acervo da instituição. Este documento deve versar e determinar as ações sobre todas as dimensões da gestão de acervo, a saber, centralmente, critérios de aquisição (coleta, compra, doação, depósito, empréstimo, legado, permuta e transferência) e descarte (há diferentes práticas de descarte de resíduos, como a incineração). Comumente, tal política se encontra no Programa de Acervo do Plano Museológico, que deve ser elaborado baseado em diagnóstico e igualmente aprovado nas instâncias deliberativas do museu.
Embora tal documentação seja basilar, a realidade institucional no cenário museológico nem sempre é a ideal. Assim, cada museu dará uma resposta para esse estudo de caso, de acordo com sua vivência.
Isto é mais um argumento da importância de “Como gerir um museu”, já que no atual momento de distanciamento social se abre uma grande oportunidade para o estudo, qualificação e diagnóstico das equipes técnicas dos museus paulistas, com a consequente elaboração ou atualização de protocolos e documentos institucionais. Para isso, também há uma série de publicações de apoio, concebidas pelo Instituto Brasileiro de Museus (IBRAM).
Como vimos, o caso apresentado se enquadra no tema da ética profissional, mas perpassa, também, a documentação institucional e museológica, mais um dado da transversalidade experimentada pelo fenômeno museal. Somente uma visão global sobre os processos museológicos, como a obra em questão oferece, pode dar conta da complexidade que é gerir um museu.
Leia a obra completa:
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Documentos de apoio à gestão museológica:
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